Capítulo 21

ALGUMAS VANTAGENS E AJUDA PARA
ENGRANDECER E INFLUENCIAR A ALMA
POR INTERMÉDIO DESSA MEDITAÇÃO

 

A quinta parte deste diretório serve para mostrar a você que vantagens terá e que ajuda deve utilizar para estimular sua meditação sobre o céu a fim de que você saboreie a doçura daquele lugar. Pois este trabalho é o principal: [...] que você consiga não permanecer no mero pensamento, mas alcance o sentido vivo de tudo em seu coração; assim perceberá que essa parte é a mais difícil desse trabalho. É mais fácil pensar o dia inteiro no céu que se sentir vivo e afetuoso nesses pensamentos por apenas quinze minutos. Portanto, permita que consideremos um pouco mais sobre o que pode ser feito para transformar seus pensamentos sobre o céu em pensamentos penetrantes, afetuosos e elevados.

 

I

O mero trabalho da fé, em comparação com o trabalho dos sentidos, tem muitas desvantagens para nós. A fé é imperfeita, pois fomos renovados apenas em parte; mas os sentidos têm sua própria força, de acordo com a força da carne; a fé trabalha contra inúmeras resistências, mas os sentidos, não; a fé é sobrenatural e, portanto, propensa a diminuir e definhar por causa da falta do hábito e da prática, [...] mas os sentidos são naturais e, portanto, continuam enquanto a natureza continuar. O objeto da fé está muito distante, [...] mas o objeto dos sentidos está bem à mão. Não é fácil regozijarmos com aquilo que nunca vemos, [...] mas não é difícil regozijar com aquilo que vemos e sentimos. Então, o que devemos fazer nesse caso? Certamente, chamar nossos sentidos para auxiliar a fé representa um ponto de nossa prudência espiritual, bem como uma ajuda singular para favorecer o trabalho da fé. [...] Deus não nos teria dado nossos sentidos, nem seus objetos usuais, se eles não fossem úteis ao louvor do Senhor, e se não nos ajudassem a nos elevar à apreensão das coisas mais elevadas. É muito notável como o Espírito Santo consente com as frases das Escrituras, ao trazê-las ao alcance dos sentidos; como ele apresenta, com palavras emprestadas dos objetos dos sentidos, as maravilhas das coisas espirituais; como ele descreve a glória da nova Jerusalém em expressões que podem ser compreendidas até mesmo pela carne: como aquelas em que afirma que as ruas e as casas são de ouro puríssimo; que as portas são de pérolas, e que o trono está no meio de tudo isso; que comeremos e beberemos com Cristo à mesa dele, em seu reino; que ele beberá conosco o fruto do vinho novo; que brilharemos como o sol no firmamento de nosso Pai; essas descrições, como a maioria das descrições de nossa glória, utilizam uma linguagem que parece se dirigir à carne e aos sentidos. [...]

Mas o que quero alcançar com tudo isso? Espero que possamos pensar que o céu é feito de ouro e pérolas, [...] ou que devemos pensar que os santos e os anjos realmente bebem e comem? Não mesmo. [...] Mas o seguinte: pensar que conceber ou falar sobre as propriedades dele está totalmente além de nosso alcance e capacidade, e que, portanto, devemos concebê-las da forma como somos capazes; e de que o Espírito não as representaria com essas noções para nós, se tivéssemos noções melhores para compreendê-las, e, assim, fazemos uso dessas expressões do Espírito para estimular nossa compreensão e nossos sentimentos, mas não para pervertê-los, e sim para usar essas noções inferiores como um espelho no qual precisamos ver as coisas mesmas, embora a representação seja muitíssimo imperfeita; e mesmo que tenhamos uma visão imediata e imperfeita ainda podemos concluir que essas expressões, embora úteis, foram emprestadas e são impróprias. O mesmo pode ser dito daquelas expressões a respeito de Deus nas Escrituras, em que ele representa a si mesmo com as imperfeições da criatura, com ira, arrependimento e desejo pelo que não acontecerá. Embora essas descrições sejam impróprias, retiradas do modo de ser do homem, ainda há um tanto em Deus que não podemos ver melhor que nesse espelho, e que, como homens, não poderíamos conceber de forma mais adequada essas noções, ou, caso contrário, o Espírito Santo teria nos dado algo melhor. [...].

Portanto, vá até ali quando separar o tempo para meditar sobre as alegrias do alto; pense sobre elas de forma ousada, conforme as Escrituras as descreveram; abaixe sua concepção até o alcance dos sentidos. A maravilha sem a familiaridade mais nos surpreende que nos deleita, mas o amor e a alegria são promovidos pelo conhecimento íntimo e familiar. [...] Portanto, não ponha Cristo mais distante de você do que ele mesmo pôs a si mesmo, para que a natureza divina não seja novamente inacessível. Pense em Cristo da mesma forma que pensa em sua natureza glorificada; pense nos santos, seus companheiros, como homens aperfeiçoados. [...] Suponha que você estivesse agora olhando essa cidade de Deus, e que você esteve na companhia de João enquanto este teve sua visão dessa glória, e que viu os tronos, a majestade, os exércitos celestiais, o esplendor radiante que ele viu; retire as suposições mais fortes que puder de seus sentidos para ajudar seus sentimentos. [...] E quanto mais sério você apresentar essa suposição para si mesmo, mais sua meditação elevará seu coração. [...] A concepção bastante familiar do estado de bem-aventurança, conforme o Espírito expressou por meio de uma linguagem complacente, e o grande aumento das suposições em nossos sentidos favorecerão nossos sentimentos nesse trabalho consagrado.

 

II

Há ainda outra forma por meio da qual, aqui, nossos sentidos são úteis para nós, e isso acontece por intermédio da comparação de objetos dos sentidos com os objetos da fé; desse modo, podemos forçar os sentidos a fornecer-nos aquele meio por intermédio do qual podemos concluir a respeito do valor transcendente da glória, ao argumentar a partir dos deleites sensoriais, ou seja, partir do menor para o maior. [...]

Compare também os deleites do alto com os deleites legítimos dos sentidos moderados. Pondere consigo mesmo: como é doce o alimento em minha boca quando estou faminto; [...] que deleite, portanto, minha alma tem ao se alimentar de Cristo, o pão da vida, e ao cear com ele, à sua mesa, no reino! [...] Como a água é agradável quando estamos muito sedentos; [...] como será prazeroso para minha alma beber daquela fonte de água viva, pois quem beber dessa água nunca mais terá sede! [...] Como as belas vistas são prazerosas ao olhar! [...] Como aquelas belezas genuínas do alto serão realmente prazerosas, e os prédios que não foram erigidos por mãos humanas, e a casa em que o Senhor mesmo habita; e as caminhadas e as paisagens da cidade de Deus, e as belezas e os deleites do Paraíso celeste! [...]

Compare também os deleites do alto com os que se encontram no conhecimento natural. Isso está muito além dos deleites dos sentidos, e os deleites do céu estão muito além deles. [...] Que prazer mergulhar nos segredos da natureza; descobrir os mistérios das artes e das ciências; ter um claro conhecimento de assuntos como lógica, física, metafísica, música, astronomia, geometria, etc. Se fizermos apenas uma nova descoberta em qualquer uma dessas áreas, ou compreendermos algo um pouco melhor que antes, que prazer singular isso nos dá! Pense, portanto, nos altos deleites que há no conhecimento de Deus, e de Cristo, seu Filho. Se a face do conhecimento humano é tão bonita, [...] imagine como é bela a face de Deus!

Compare também os deleites do alto com os deleites da moralidade e com as das afeições naturais. Que deleite muitos pagãos sensatos têm nas regras e nas práticas das responsabilidades morais, de forma que apenas consideram homem honesto aquele que se comporta bem por amor à virtude, e isso não por medo da punição! [...] Pense, portanto, que maravilha haverá naquela rara perfeição à qual alcançaremos no céu; e naquela beleza incriada de Deus que observaremos. Que doçura há no exercício do amor natural em relação às crianças, aos pais, aos companheiros e aos amigos? O prazer que dois amigos fiéis sentem no amor e na afabilidade um pelo outro é o deleite mais doce e agradável. [...] Até mesmo Cristo, assim parece, teve um pouco desse tipo de amor; pois ele tinha um discípulo a quem amava de forma especial. [...] Se os deleites de uma amizade cordial e íntima são tão grandes, que deleite teremos na amizade do Altíssimo; e em nossa amizade mútua com Jesus Cristo; e em nos-so precioso amor pelos santos e na estimada companhia deles. [...] Estes serão nossos amigos mais agradáveis e encantadores que qualquer outro que tivemos debaixo do sol; e nossos sentimentos por nosso Pai e por nosso Salvador, mas, especialmente, a afeição dele por nós, isso será algo que nunca conheceremos aqui. [...] Portanto, nosso amor será mil vezes mais forte e doce do que somos capazes de amar debaixo do sol; e assim como todos os atributos e obras de Deus são incompreensíveis, também o atributo e obra do amor o são. [...]

Compare também as maravilhas do céu com aquelas gloriosas obras da criação que, agora, nossos olhos observam. [...] Que porção da majestade do grande Criador brilha na face desta estrutura do mundo! [...] Isso torna o estudo da filosofia natural muito agradável, pois as obras de Deus são magníficas. Que obra rara é o corpo do homem, sim, o corpo de qualquer criatura viva, o que torna o estudo de anatomia tão encantador! Que maravilha observamos em cada planta; na beleza das flores; na natureza, na diversidade e no uso das ervas; nas frutas, nas raízes, nos minerais! Mas, especial-mente, se observarmos as obras maiores; se considerarmos o corpo inteiro desta terra, e suas criaturas, e seus habitantes; o oceano com suas moções e dimensões; a variedade das estações e da face da terra; o relacionamento da primavera com o outono, do verão com o inverno; que maravilha existe ali! Pense, portanto, em sua meditação, se essas coisas, que não passam de servos do homem pecador, ainda estão repletas de valores ocultos, que lugar é aquele onde Deus habita e o qual está preparado para os justos aperfeiçoados com Cristo. Quando você caminha à noite, olhe para as estrelas e observe como brilham, e elas, em grande quantidade, enfeitam o firmamento. Se à luz do dia olhar para o glorioso sol, veja o amplo e extenso céu que nos envolve e diga para você mesmo: "Que glória existe na menor e mais longínqua estrela! Que corpo vasto e brilhante tem a lua, e todo nosso planeta! Que glória inconcebível tem o sol! Oras, tudo isso é nada comparado com a glória do céu. Ali, o sol deve ser deixado de lado como algo inútil, pois não mais será visto por causa do brilho de Deus; [...] ali, ele não passa de escuridão comparado com a radiante casa de meu Pai. [...] Portanto, pense em todas as outras criaturas. Toda a terra nada mais é que o escabelo de meu Pai; esse trovão não é nada comparado à voz formidável dele; esses ventos não são nada comparados ao fôlego de sua boca. Tanta sabedoria e tanto poder, conforme se revelam em toda a criação; e desfrutaremos, no gozo genuíno de Deus, de muito mais grandeza, e bondade, e agradáveis deleites. [...]

Compare as coisas que você deve desfrutar no alto com as maravilhas daqueles admiráveis trabalhos da providência que Deus exercita na igreja e no mundo. Que coisas gloriosas o Senhor fez! [...] Não seria uma visão maravilhosa ver o mar como uma parede, à direita e à esquerda, e a terra seca aparecer no meio, e o povo de Israel passar seguramente através das águas divididas? [...] Mas veremos coisas maiores que essas; e, assim como nossa visão será ainda mais maravilhosa, também será mais doce. [...] Ó que obras raras e poderosas vimos na Grã-Bretanha; [...] que claras descobertas de um poderoso exército; que ampliação da fraqueza; que humilhação da força; que maravilhas operadas pelos meios mais improváveis; [...] que transformação das lágrimas e dos temores em segurança e alegria; respostas às orações sinceras! [...] Mas o que isso tudo representa diante de nossa libertação total, de nossa conquista final, de nosso triunfo eterno e daquele grande dia das grandes coisas?

Compare também as misericórdias que você deverá ter no alto com aquelas providências singulares que você mesmo desfrutou, e aquelas misericórdias observáveis que você registrou ao longo de sua vida. Se você realmente é cristão, tem registrado [...] em seu coração [...] inúmeros favores preciosos; e doce é a mera lembrança e o simples relato deles. [...] Mas tudo isso é nada para as misericórdias que estão no alto. Examine as maravilhosas misericórdias de sua juventude e de sua educação, as misericórdias de sua idade mais madura, as misericórdias de sua prosperidade e de sua adversidade; as misericórdias de seus vários locais e dos muitos conhecidos e familiares, e eles não são primorosos e inúmeros? [...] Que doçura você sentiu quando Deus clarificou suas últimas dúvidas; quando ele dominou e silenciou seus medos e sua descrença; [...] quando aliviou suas dores; quando curou sua doença e levantou você do túmulo e da morte? [...] Todas essas misericórdias não foram as mais preciosas? [...] Portanto, que doce será a glória de sua presença, e quão alto seu amor eterno me exaltará, e quão grande serei quando estiver em comunhão com sua grandeza! Se minha peregrinação e lutas receberam tais misericórdias, imagine o que encontrarei em minha casa e em meu triunfo! [...] Se recebi tanto neste país estrangeiro, quando estava muito distante dele, imagine o que terei no céu quando estiver bem diante dele?

Compare os confortos que você terá no alto com os que você recebeu aqui em suas ordenanças para se aproximar de Deus. A Palavra escrita não é uma fonte da qual jorra conforto dia e noite para você? [...] Que textos apropriados da Escritura o Espírito pôs diante de você? [...] Se a Palavra está repleta de consolações, que mananciais encontraremos em Deus! Se suas cartas são tão abençoadas, imagine então as palavras que saírem de sua abençoada boca! [...] Se o testamento de nosso Senhor e nosso título para o reino são tão confortáveis, imagine o que representará o tomar posse desse reino! Pense mais adiante, que deleites encontrei na Palavra pregada! Quando me sentei aos pés de um mestre divino que perscrutava o coração, como meu coração aqueceu em meu íntimo! [...] Quantas vezes fui à congregação perturbado em espírito e voltei para casa calmo e alegre! Quantas vezes duvidei, [...] e Deus mandou-me de volta para casa com minhas dúvidas resolvidas, e satisfez-me, e persuadiu-me de seu amor em Cristo! Com que freqüência andei na escuridão, cheio de dúvidas em minha mente, e Deus revelou para mim preciosas verdades, como também abriu meu entendimento para vê-las, a fim de que sua luz fosse um magnífico conforto para minha alma! Que afeto e estímulo encontrei em minhas mais tristes aflições; que preparativos para fortalecer-me para meu encontro com ele! Se a face de Moisés resplandecia gloriosamente, quanta glória há na face de Deus! Se os pés dos mensageiros dessas notícias de paz são belos, imagine a beleza da face do Príncipe da Paz! Se a palavra na boca de um servo e companheiro é tão agradável, imagine a Palavra viva! Se esse tesouro é tão precioso em vasos de barro, imagine esse tesouro armazenado no céu! [...]

Pense também na alegria de ter acesso e aceitação na oração para que, quando nada me aflige, possa chegar até Deus e expor meu caso e abrir minha alma para ele, como faço com meu amigo mais fiel. [...] E a alegria será insuperavelmente indizível, quando receber todas as bênçãos sem pedir por elas, [...] e quando Deus for uma porção de minha alma.

Que consolo recebemos, com freqüência, na ceia do Senhor! [...] Ter sua aliança selada para mim por meio das ordenanças exteriores, e seu especial amor selado por seu Espírito em meu coração! Mas toda a vida e todo o conforto disso tudo é para declarar e garantir-me os confortos que terei na vida futura; o uso delas representa apenas sombriamente aquelas misericórdias mais sublimes. A celebração ali será realmente agradável e prazerosa! [...]

Compare a alegria que você terá no céu com aquela que os santos de Deus encontraram no caminho para lá e no antegozo dela. [...] Quantas vezes lemos e ouvimos a notícia de santos que morreram e, quando mal tinham forças e vida para se expressar, estavam tão cheios de alegria quanto era possível caber em seu coração e [...] tinham tanto do céu em seu espírito que sua alegria suplantou em muito suas tristezas. E se, em meio ao mar da adversidade, uma faísca desse fogo é tão gloriosa, imagine o que é aquele sol de glória! Ó, a alegria que os mártires de Cristo sentiram em meio às chamas ardentes; [...] portanto, apenas algo excelente faria a alma deles regozijar-se, enquanto o corpo era engolido pelas chamas; quando Thomas Bilney puder queimar seu dedo em uma vela, e Thomas Cranmer puder queimar sua indigna mão direita; James Bainham puder chamar os papistas para ver um milagre e dizer-lhes que ele não sente mais dor do que se estivesse em uma cama confortável, e que o fogo para ele era como um canteiro de rosas; [...] certamente apenas um maravilhoso antegozo da glória pode fazer tudo isso; pode fazer parecer fácil as chamas do fogo. [...] Sanders pôde abraçar de forma tão prazerosa a fogueira e clamar: "Bemvinda a cruz!", e não devo abraçar ainda com mais alegria minha bênção e clamar: "Bem-vinda a coroa!". O abençoado John Bradford pôde beijar o feixe de lenha, e não devo beijar o Filho. [...] O fogo e o feixe de lenha, as prisões e os banimentos, o escárnio e os tormentos cruéis devem ser mais bem-vindos para os outros que Cristo e glória serão para mim? Que Deus não permita isso! [...]

Compare também a glória do reino celestial com a glória da igreja imperfeita aqui na terra, e com a glória de Cristo em sua condição de humilhação, e você pode facilmente concluir: se Cristo sob a ira de seu Pai e Cristo na sala dos pecadores foram tão magníficos em maravilha, então o que é Cristo à direita do Pai? Quão maravilhoso foi o Filho de Deus na forma de servo! [...] Ó que poder, e domínio, e glória ele tem agora; e teremos para todo o sempre essa glória com ele! [...] Ó imagine a glória do reino! Que domínio absoluto tem Cristo e seus santos! E se eles têm esse poder e honra no dia de sua humilhação e no momento estipulado para seu sofrimento e desgraça, imagine o que terão em sua plena reparação!

Compare as misericórdias que deve ter no alto com as misericórdias que Cristo concedeu aqui a sua alma, e as gloriosas mudanças que você terá por fim com as graciosas mudanças que o Espírito realizou em seu coração; compare os confortos de sua glorificação com os confortos de sua santificação. A menor graça em você é genuína e sincera, mas ela é mais valiosa que as riquezas das Índias; o menor desejo vigoroso ou o suspiro sincero por Cristo, mas isso deve ser mais valorizado que os reinos deste mundo. Uma natureza renovada é a imagem exata de Deus. [...] É o brilho da face de Deus; é a semente de Deus remanescente em nós; é a única beleza da alma racional; essa semente enobrece o homem acima de toda nobreza; ela o ajuda a compreender o prazer de seu Criador, a fazer a vontade do Senhor e a receber sua glória. Portanto, pense consigo mesmo: se esse grão de mostarda é tão precioso, imagine o valor da árvore da vida no Paraíso de Deus! [...] Se foi-nos dito que somos semelhantes a Deus, feitos à sua imagem, e que somos santos quando--meu Deus!--somos pressionados por esse corpo de pecado, certamente seremos muito mais parecidos com Deus quando formos perfeitamente santos e sem mácula. [...] A misericórdia de minha conversão foi tão excessivamente grande que os anjos de Deus regozijam ao presenciá-la? Certamente, portanto, a misericórdia de minha salvação será tão grandiosa que os anjos parabenizarão minha felicidade. Essa graça não passa de uma faísca que ajuntamos nas cinzas; ela está coberta de carne proveniente da perspectiva do mundo; [...] mas minha glória eterna não será obscurecida, nem minha luz ficará embaixo de uma vasilha, mas ficará em cima de uma montanha, até mesmo em Sião, o monte de Deus.

Por fim, compare as alegrias que você deve ter no alto com os antegozos do céu que o Espírito lhe deu aqui. Julgue como será o oceano de alegria por aquela gota que você experimentou. [...] Deus, algumas vezes, não se revelou de forma extraordinária a sua alma e permitiu que uma gota da glória caísse nela? [...] Você, em um sermão vívido sobre o céu, ou em suas contemplações individuais sobre aquela abençoada condição, nunca percebeu [...] a luz do céu irromper em sua alma, como a estrela da manhã, ou como o raiar do dia? Você, nessas responsabilidades, nunca percebeu seu coração, como se ele fosse a criança ressuscitada por Eliseu, recuperar a vida ao sentir o calor aumentar em seu íntimo? Portanto, pense consigo mesmo, qual será o fervor quando receber a herança toda? Também, toda essa luz que muito me surpreende e me alegra não passa de uma vela do céu para levar-me até lá caminhando através deste mundo de trevas. Se a luz da estrela à noite, ou o pequeno bruxuleio no romper do dia, é semelhante a essa vela, imagine a luz do dia ao meio-dia! Se alguns homens piedosos, conforme lemos, foram dominados pela alegria a ponto de clamar: "Senhor, retenha sua mão; não agüento mais"; como os olhos cansados não agüentam muita luz, imagine que alegrias terei no céu quando minha alma, uma vez que o objeto de minha alegria deve ser nosso glorioso Deus, for capaz de vê-lo e de desfrutar dele. E meus olhos, embora essa luz seja mil vezes mais forte que a do sol, serão capazes de observálo para todo o sempre.

Assim acabo a quinta parte deste diretório, e, aqui, mostrei a você sobre qual fundamento deve progredir com suas meditações, e como fazer com que elas estimulem seus sentimentos, ao comparar os deleites invisíveis do céu com aqueles menores que você viu e sentiu na carne.