Capítulo 12

UMA EXORTAÇÃO PARA AJUDAR
OS OUTROS A ALCANÇAR ESSE
DESCANSO

 

Deus pôs diante de nós um prêmio tão glorioso quanto o é esse descanso eterno dos santos e fez o homem capaz de alegria tão inconcebível? Então, por que todas as crianças desse reino não se apressam mais para ajudar os outros a desfrutar dele? Deus meu! E como essas pobres almas ao nosso redor devem tão pouco à maioria de nós! Vemos a glória do reino, mas essas pessoas não o vêem; vemos a miséria e o tormento daqueles que o perdem, mas eles não vêem isso; vemos essas pessoas se desviarem bastante do caminho, sabendo que se elas continuarem assim jamais chegarão lá, mas elas não são capazes de discernir isso. E, mesmo assim, nós não as abordamos seriamente para mostrar o perigo e o erro a fim de ajudar a trazê-las para o caminho onde possam viver. Deus meu! Encontramos tão poucos cristãos que vivem como homens que ali estão para fazer o bem e que se dedicam com todas suas forças a salvar almas! [...] Portanto, gostaria que você compreendesse muito bem qual é esse trabalho que quero persuadi-lo a realizar. [...]

Assim, a responsabilidade que o pressionaria a realizar consiste dos seguintes aspectos:

Que seu coração seja afetado pela miséria da alma de seus irmãos; que você tenha compaixão deles; que você deseje ardentemente que eles se convertam, e que seu coração esteja voltado a só fazer o bem para eles, isso estabeleceria um trabalho para você, e o Senhor, usual-mente, abençoa essa empreitada. Pegue todas as oportunidades possíveis para conversar em particular com eles sobre o estado em que se encontram a fim de instruí-los e ajudá-los a conseguir a salvação [...] Inicie o trabalho sinceramente e com as intenções corretas. Permita que seus fins sejam a glória de Deus na festa da salvação. Faça isso não para ganhar um nome, ou estima, para si, nem para fazer com que os homens dependam de você. [...] Mas certifique-se de que o objetivo principal é recuperá-los da miséria e trazê-los ao caminho do descanso eterno. [...] Aqueles que fazem isso com compaixão e com amor delicado para com a alma dos homens são os que fazem isso em obediência a Cristo, o mais delicado de todos, amante apaixonado das almas; os que imitam o Salvador quanto à medida e ao local, que vieram para buscar e salvar os que estavam perdidos. Faça isso o quanto antes; como se você não quisesse que eles atrasassem o retorno deles; assim, não se atrase em sua busca para fazê-los retornar. [...] Atrasar sua responsabilidade é uma demonstração de grande desobediência, embora você a desempenhe depois: isso é demonstração de um coração doente e indisposto para o trabalho. Quantos pobres pecadores perecem, ou criam raízes, praticamente incuráveis, no pecado, enquanto nos propomos a buscar a recuperação deles! As oportunidades não duram para sempre. [...]

Que a sua exortação proceda da compaixão e do amor, e que a forma como a demonstra demonstre claramente à pessoa com quem lida de onde ela procede. A forma promissora para trabalhar na mudança de um homem não é por meio do sarcasmo, do desprezo, ou da reprovação; tampouco, a forma correta para convertê-lo a Cristo não é por meio das afrontas ou da humilhação com palavras de desgraça. Os homens consideraram seus inimigos os que os tratam dessa forma, e as palavras de um inimigo não são muito persuasivas. Portanto, deixe de lado sua paixão, e pegue a compaixão, e vá ao encontro dos pecadores com lágrimas nos olhos para que eles vejam que você realmente lamenta, de forma genuína, o caso deles. Lide com eles com súplicas humildes e sinceras. Deixeos ver que o único desejo de seu coração é fazer-lhes o bem. Deixeos perceber que você não tem qualquer outra finalidade senão buscar a felicidade eterna deles; e que o que o leva a falar é saber o perigo que eles correm, o amor que você tem pela alma deles. [...] Sei que é Deus quem muda o coração dos homens, mas também sei que Deus trabalha por nosso intermédio, e que, quando ele real-mente quer persuadir os homens, ele geralmente provê os melhores meios para cada caso e impulsiona homens a argumentar com eles de forma convincente e, assim, entra com sua graça e torna essa empreitada bem-sucedida. Certamente, aqueles que já tentaram podem lhe dizer, por experiência própria, que não há caminho mais convincente para os homens que o do amor e o da compaixão. [...]

Outro conselho que lhe daria seria este: faça tudo com toda clareza e fidelidade; não use atenuantes nem esconda dos homens suas misérias, o perigo que correm, ou qualquer outro fato relevante para eles; não torne o pecado deles menor do que realmente é, nem abrande sua linguagem para falar sobre eles; não os encoraje a ter uma esperança, ou fé, vã, da mesma forma como não desencorajaria as esperanças sadias dos retos. Se você perceber que o caso deles é perigoso, diga-lhes claramente isso. [...] Ficar dando voltas, à distância, não é o que os ajudaria na conversão. [...]

E da mesma forma que você precisa fazer isso de forma clara, também precisa agir com seriedade, zelo e eficácia. Tal é a natureza da tremenda estupidez e do entorpecimento do coração dos homens que nenhuma outra forma de agir produzirá efeito. Você precisa gritar para fazer com que os homens despertem desse desfalecimento ou abandonem essa letargia. [...] Portanto, se for para você lhes fazer o bem, é preciso que afie sua exortação, direcione-a e acompanhe-a até o coração deles, até que eles despertem e comecem a olhar a sua volta. Deixe-os saber que você não fala com eles sobre coisas indiferentes. [...] Trabalhe para que os homens saibam que é loucura zombar da salvação ou da condenação, e que não se deve brincar com o céu e o inferno, nem ignorar esse assunto ao dedicarlhe apenas alguns pensamentos indiferentes. [...] O que você acha? O mundo se consume; seus prazeres se desbotam, suas honras o abandonam; seus lucros provar-se-ão inaproveitáveis para vocês; o céu ou o inferno está logo ali adiante de você; Deus é justo e zeloso; as ameaças dele são verdadeiras; o grande dia de seu julgamento será terrível; você já tarda; seu tempo de vida se escoa rapidamente; sua vida é incerta; você já se demora o bastante; seu caso é perigoso; sua alma está imersa no pecado; você é um estranho para Deus; sua mente está cauterizada por causa dos maus hábitos; você não tem garantia de perdão para mostrar; como você está despreparado para morrer amanhã; e com que terror sua alma abandonará seu corpo! E diante de tudo isso, você ainda se demora? Oras, considere isso: Deus agüenta tudo isso enquanto espera que você se detenha em seu lazer; a paciência do Senhor tolera, e sua justiça refreia-se; e sua misericórdia suplica a você; Cristo está ali para oferecer-lhe seu sangue e seus méritos; você pode tê-lo gratuitamente e morar com ele; o Espírito persuade você, e sua consciência o acusa e o insta a aceitá-lo; os ministros oram por você; e o chamam; Satanás está à espreita para que possa ter você, quando a justiça colher sua vida. Este é o seu tempo: agora ou nunca. O quê? Você prefere perder o céu que seus lucros ou prazeres? [...] Ó amigo, o que você acha dessas coisas? Deus o fez ser humano, e o dotou de razão, e você nega sua razão onde mais deveria usá-la? Você deve lidar assim, des-sa forma séria e direta, com os homens. [...] Confesso que falhei muito em relação a isso; que o Senhor não me cobre por isso. A relutância em desagradar aos homens nos leva a destruí-los.

No entanto, aconselho-o a fazer isso com prudência e discrição. Seja tão sério quanto possível, mas com sabedoria; e seja especial-mente sábio na escolha dos seguintes aspectos: escolher o momento mais oportuno para sua exortação; não tratar com os homens enquanto agem sob o impulso da paixão, quando estão alcoolizados, ou em público, quando podem considerar sua exortação uma desgraça. Os homens devem observar quando os pecadores estão mais aptos a ouvir instruções. Medicamentos não devem ser ministrados a todo momento, mas na época apropriada. A oportunidade favorece todo trabalho. [...] Ademais, os meios funcionam perfeitamente, se você aproveitar a oportunidade; quando a terra está ma-cia, o arado a perfura. [...] A fidelidade dos cristãos realmente exige não só que façamos o bem quando ele cai em nosso caminho, mas também que procuremos oportunidades para fazer o bem. Seja sábio também ao ajustar sua exortação à pessoa e ao temperamento dela. [...] Nem todos suportam o tratamento mais duro. É preciso amor, e sinceridade, e seriedade para com todos. [...] Seja sábio também ao usar a expressão mais adequada; [...] se você reveste a verdade mais bela e cordial com a violência sórdida da linguagem imprópria, fará com que os homens a desprezem como algo monstruoso e deturpado, embora seja fruto de Deus, e sua natureza, a mais sublime.

Permita que todas suas reprovações e exortações sejam apoiadas pela autoridade de Deus. Permita que os pecadores se convençam que você não fala por você mesmo, nem se fundamenta em suas próprias idéias. [...] Quanto mais Deus aparecer em nossas palavras, mais eles a aceitarão. [...] Eles podem e devem rejeitar suas palavras, mas não ousariam rejeitar a palavra do Altíssimo. Portanto, certifique-se de que eles saibam que você não fala nada senão aquilo que Deus falou primeiro.

Você também precisa ser constante nessa responsabilidade de exortação junto aos homens; não basta uma ou duas vezes para que a verdade de Deus prevaleça. [...] Se eles não forem acompanhados, logo se esfriam novamente. Fadigue os pecadores com suas súplicas amorosas e sinceras; acompanhe-os e não permita que eles tenham descanso em seu pecado. Essa é a verdadeira caridade, e essa é a forma de salvar a alma dos homens; e uma atitude que lhe trará conforto toda vez que a rever.

Lute para trazer toda a exortação a um ponto específico; não se atenha ao trabalho feito, mas busque o sucesso, e objetive o fim em todas suas falas. [...] Portanto, trabalhe para direcionar todas suas falas para o assunto desejado. Se você estiver reprovando um pecado, não cesse até que o pecador lhe prometa que abandonará esse pecado e evitará as oportunidades que propiciam que ele caia em tentação; se você o estiver exortando a realizar uma responsabilidade, estimule a pessoa a prometer-lhe que a fará. Se você leva as pessoas para Cristo, [...] não as abandone até que elas admitam a necessidade que têm de Cristo, bem como de mudança na vida que levam, e até que elas lhe prometam se aproximar da utilização desses meios. [...]

Por fim, certifique-se de que seu exemplo, bem como suas palavras, possam servir como exortação. Permita que as pessoas vejam que você realiza, de forma constante e consistente, as responsabilidades que as persuade a realizar; permita que elas vejam em sua vida a diferença entre você e os pecadores, e a maravilha de sua vida em relação à do mundo, a vida que você as persuade a levar em seus discursos. Permita que elas vejam seu trabalho constante em favor do céu, e que você realmente acredita naquilo que quer que elas acreditem. Se você fala para as pessoas sobre as admiráveis alegrias do céu, mas, na verdade, não faz nada a não ser se escravizar em relação ao mundo, e luta para ficar rico, ou tem a tendência a discutir com seu próximo por causa de bens terrenos, como qualquer outra pessoa o faria, quem acreditaria em você? Ou quem seria persuadido por você para buscar as riquezas eternas? [...] Não permita que os homens vejam seu orgulho, enquanto os exorta para que sejam humildes; nem que sua consciência fique insensível em relação a algo, enquanto gostaria que eles fossem sensíveis em relação a algum outro aspecto. Uma vida inocente é uma reprovação constante, contínua e poderosa ao iníquo; e a prática constante de uma vida santa e consagrada causa constante inquietação à consciência comum, além de ser uma constante solicitação para que ele mude o curso de sua vida.

Além da responsabilidade da tarefa particular de admoestação, você deve fazer o máximo para ajudar os homens a se beneficiar por meio das ordenanças públicas. [...] E você, enquanto desfruta da bênção do evangelho, deve fazer uso da maior diligência possível para ajudar as pobres almas a receber o fruto da Palavra. E, para essa finalidade, você deve estimular os homens a ouvir o evangelho e a comparecer aos cultos. Lembre-os constantemente do que eles ouviram; estimule-os, se possível, a repetir o que ouviram para a família. Se isso não for possível, então os estimule a procurar outras pessoas para quem possam repetir as palavras do evangelho, para que assim essas palavras não morram no ato de ouvir. O estímulo para que esses homens busquem a companhia e a familiaridade dos piedosos, além dos benefícios que têm por meio desse empenho, é particularmente útil para a recuperação da alma deles. A participação aumenta a familiaridade, e a familiaridade aumenta o amor; e a familiaridade e o amor para com os piedosos levam à familiaridade e ao amor para com Deus, e também levam à piedade. Esse também é o meio para eliminar o preconceito, ao confundir a calúnia do mundo em relação ao caminho do Senhor e ao povo de Deus. Portanto, tenham o costume de se reunir, além da reunião mais coletiva na congregação, não para dar vazão às opiniões insanas; nem para manifestar desgosto pela reunião pública; nem em oposição a ela; nem no mesmo horário da adoração coletiva; nem para criar um cisma sem fundamento; nem para se separar da igreja de onde vocês são membros; nem para destruir a antiga igreja para que você possa reunir uma nova a partir da ruína daquela, desde que a antiga tenha o essencial e haja esperança de reformá-la; e, tampouco, gostaria que você promovesse essas reuniões para ventilar seus dons e partes do ensinamento, quando não há necessidade para isso. [...] Mas a responsabilidade para a qual gostaria que se reunissem é esta: orar juntos pela igreja e por vocês; unir-se em louvores a Deus; apresentar suas inquietações, e dúvidas, e medos, e chegar a decisões; estimular uns aos outros em amor para que tenham um caminhar santo e divino; e tudo isso, não como uma igreja separada, mas como uma parte mais diligente da igreja que o resto, quanto ao tempo da redenção e à ajuda mútua, para que caminhem em direção ao céu. [...]

E agora, caro leitor cristão, considerando isso como uma responsabilidade que Deus pôs sobre todo homem de acordo com a habilidade dele, portanto, exorte e reprove; e, com toda a diligência possível, faça isso ao trabalhar pela salvação de todos a sua volta e ao julgar, a seguir, se essa responsabilidade foi conscienciosamente realizada. Onde encontraremos o homem em nosso meio que esteja disposto a realizar essa responsabilidade com todas suas forças? [...]

Portanto, devemos indagar quais podem ser as causas dessa negligência em relação à responsabilidade, que os impedimentos que descobrimos possam ser os mais fáceis de ser transpostos.

Um impedimento é a própria insolência e culpa dos homens. Eles não foram arrebatados com as delícias do céu: como, portanto, eles podem estimular outros a buscá-las sinceramente? [...] Os homens também são culpados dos pecados que devem reprovar, e isso faz com que se calem, pois se sentem envergonhados para exercer essa reprovação. Outro impedimento é a infidelidade secreta que prevalece no coração dos homens, da qual até mesmo os melhores têm uma grande porção dela, o que leva essa responsabilidade a ser executada pela metade. Nós não cremos na miséria humana; não acreditamos que as ameaças de Deus sejam verdadeiras. [...] A maioria de nós realmente acredita nas profecias das Escrituras, mas da mesma forma como acreditamos nas previsões de um almanaque que nos diz que em tal dia teremos chuva, e em tal dia, ventos fortes; você acha que isso pode vir a acontecer, ou não. [...] Se não fosse por essa maldita descrença, nossa própria alma e nosso próximo ganhariam mais conosco do que ganham no momento.

Esse tratamento fiel com os homens para a salvação destes fica também muito obstruído por nossa falta de caridade e compaixão pelas almas deles. [...] Fazemos exatamente o que o sacerdote e o levita fizeram ao ver o homem ferido, nós os observamos e passamos pelo outro lado. [...] A miséria é o pleiteante mais eficaz para aquele que é compassivo. [...] Seu próximo é aquele que está próximo a você, e seus amigos, aqueles que estão na casa com você; você come, e bebe, e trabalha, e anda, e conversa com eles, mas, mesmo assim, você diz muito pouco, ou nada, para eles. Por que você não ora para que eles considerem seus caminhos e os abandonem, e também não ora para que Deus os converta? [...] Oras, se você vir seu próximo caído à beira do caminho, e se ajoelhar imediatamente para pedir a Deus para ajudar esse pobre coitado caído à beira do caminho, mas não estender sua mão para ajudá-lo, nem tentar persuadi-lo e, tampouco, direcioná-lo para que possa ajudar-se a si mesmo, você não seria censurado por ser cruel e hipócrita? "Se alguém tiver recursos materiais e, vendo seu irmão em necessidade, não se compadecer dele, como pode permanecer nele o amor de Deus?" (1Jo 3.17). [...]

Outro impedimento é a disposição básica existente em nós de agradar os homens; e temos tanto desejo de ter crédito com eles e de os beneficiar que isso, de forma inconsciente, leva-nos a negligenciar nossa bem-conhecida responsabilidade. Tolo, e o amigo mais infiel, é o médico, se deixar que um doente morra por temor de perturbá-lo. [...] Como homens que amam mais o benefício e o louvor dos homens que o benefício de Deus podem ser cristãos? Pois se eles buscam agradar aos homens, não mais são servos de Cristo. [...]

Outro impedimento comum é a timidez pecaminosa. [...] A timidez é imprópria em casos de declarada necessidade; e, na verdade, esse não é um trabalho do qual um homem deva se envergonhar. Obedecer a Deus ao persuadir os homens de seus pecados para que abracem a Cristo e ajudar a salvar a alma deles não é uma responsabilidade que deva fazer com que o homem fique ruborizado de vergonha. [...]

Outro impedimento é a impaciência, a preguiça e o favorecimento da carne. Esse é um trabalho ingrato e, em grande parte, faz com que aqueles que eram nossos amigos se tornem nossos inimigos. [...] Ademais, esse trabalho é aquele que raras vezes é bemsucedido na primeira empreitada, exceto quando acompanhado por sabedoria e infatigabilidade. [...] Esse é um caminho entediante para a carne, e poucos o suportarão; isso sem levar em consideração a paciência que Deus teve em relação a nós, quando estávamos em nossos pecados, e o longo tempo que nos acompanhou com seu Espírito nos importunando, apresentando-nos a vida e a Cristo, e suplicando para que nós os aceitássemos. Ai de nós se Deus tivesse sido impaciente conosco como o somos com os outros. Se Cristo não se cansou nem desistiu de convidá-los, temos poucas razões para nos cansarmos de entregar a mensagem.

Outro impedimento é o egoísmo e o ocupar-se apenas consigo mesmo. Os homens só pensam neles mesmos, e todos só se ocupam de suas próprias coisas, e poucos deles se ocupam das coisas de Deus e de seus irmãos. [...] Se esses homens tentassem aquilo que alguns de seus irmãos já tentaram, saberiam que todas as mais puras ordenanças e igrejas não podem lhe oferecer aquele saudável conforto que lhes é oferecido com a conversão de alguns pecadores por meio de nossas exortações incansáveis e compassivas. Dois homens, em uma estação muito fria, chegam a um lugar onde há um grupo de pessoas prestes a morrer de fome; um deles aconchega-se e busca abrigo, por temer que possa perecer com eles; o outro, por piedade, cai de joelhos para esfregá-los para que possam recuperar o calor do corpo e, enquanto trabalha arduamente para ajudá-los, ele se aquece bem mais que seu inútil companheiro. Para muitos, o orgulho também é um grande impedimento. Se fosse para falar com um homem importante, fariam isso e, certamente, isso não os desagradaria. Mas estar no meio da multidão de pobres, e esforçar-se para alcançar um grupo de pedintes ignorantes, ou pessoas mesquinhas, e sentar-se com esse tipo de pessoa em uma cabana desagradável e cheia de fumaça e, ali, instruí-los e exortá-los dia após dia--onde está a pessoa disposta a fazer isso? [...] E quanto ao povo comum, eles não os buscam, como se Deus fosse alguém que prestigiasse os ricos, ou que a alma de todos não representasse a mesma coisa para ele. Deus meu! Esses homens não levam em consideração o quanto Cristo se humilhou por nós! [...]

Por fim, para alguns, a ignorância quanto à responsabilidade os impede de realizá-las. Ou não sabem que é uma responsabilidade, ou, pelo menos, não a consideram sua responsabilidade. Talvez não a tenham considerado com empenho, nem foram pressionados por seus mestres. [...] Um deles declara: "Sou muito fraco e tenho poucos dons". Não é a maravilha do discurso que ganha almas, mas a autoridade de Deus manifesta por meio daquele discurso, e a autoridade da Palavra do Senhor na boca do instrutor. Uma frágil mulher pode dizer o que Deus disse nas passagens claras da Palavra tanto quanto um homem culto! [...]

Para concluir, [...] deixe-me pedir-lhe que considere esses motivos a seguir. Considere que a natureza ensina a comunicação do bem, e a graça dispõe especialmente a alma para isso; portanto, a negligência desse trabalho é pecado contra a natureza e contra a graça. Aquele que, por si mesmo, jamais busca a Deus seria rapidamente considerado por todos como alguém desprovido da graça; e, quando nos foi ordenado a amar ao nosso próximo como a nós mesmos, aquele que não trabalha para a salvação dos outros também não é tão desprovido da graça? [...]

Considere o quanto Cristo valorizou as almas e o que ele fez para salvá-las. Ele achou que elas valiam seu sangue e seu sofrimento, e também nós não deveríamos considerá-las tão valiosas quanto o fôlego de nossa boca? Você não se alistaria nas fileiras de Cristo para realizar tão grande responsabilidade; nem faria um pouco por aquilo que ele tanto entregou?

Considere quão dignas de pena são essas almas. [...] Se outros não se compadecerem delas, elas não terão piedade; pois a natureza da doença delas é torná-las impiedosas para sua própria alma, sim, torná-las a mais cruel destruidora de si mesmas. [...] É por seu próximo, seu irmão, a quem você é compelido a sentir compaixão e a amar como a si mesmo. Aquele que não ama seu irmão, a quem vê diariamente, quase certamente não ama a Deus, a quem ele jamais viu. [...] E você, da mesma forma como é culpado da ruína dessas pessoas, também é culpado por todo pecado que elas cometem. Se elas se converterem, elas quebram a maldição do pecado; e se você fizer sua responsabilidade, você sabe que elas podem se converter. [...] Você também é culpado, como acontece em relação ao pecado, de toda a desonra que Deus sofrer por meio disso. E quanto isso representa? E como o cristão deve ser cuidadoso em relação à glória de Deus, cuja menor parte deve ser mais valorizada que nossa própria vida! [...]

Considere a alegria que é para você estar no céu, encontrar aqueles a quem você foi o meio para trazê-los até esse magnífico lugar; ver a face deles e juntar-se a eles para entoar louvores eternos a Deus; para quem fomos instrumentos para trazê-los para que conhecessem a Cristo e lhe obedecessem! O que acontecerá ali, nós não sabemos; mas, certamente, de acordo com nossa condição atual, essa não será uma alegria fugaz! [...]

Esse é o trabalho da maior caridade, e aquele que todos vocês podem realizar. [...] O mais pobre dos homens pode ser tão caridoso quanto o rico. [...] Você pode ser um instrumento nesse abençoado trabalho de salvar almas, uma obra pela qual Cristo veio à terra e morreu por nós, uma obra na qual os anjos do Senhor se regozijam; [...] e como Deus poderia honrá-lo de forma mais sublime que o transformar em instrumento para essa grandiosa obra? Essas almas o abençoarão aqui e na vida por vir. Elas podem ficar bravas com você logo de início, mas se você prevalecer, e suas palavras forem bem-sucedidas, elas abençoarão o dia em que vocês se conheceram, e abençoarão a Deus que o enviou para falar com elas. Se você for bem-sucedido, Deus será muito glorificado por isso; ele terá uma alma a mais para valorizar e aceitar seu Filho, alguém em quem o sangue de Jesus alcançou sua finalidade; ele terá uma alma a mais para amá-lo, e adorá-lo diariamente, e temê-lo, e servi-lo em sua igreja. A igreja também ganhará com isso. [...] Se você pudesse converter apenas um perseguidor, como Saulo, ele poderia ser tornar um Paulo e prestar mais serviço à igreja do que você já prestou. [...] Esse é o caminho para a pureza e o florescimento da igreja, bem como do estabelecimento correto e da execução da disciplina de Cristo. Se, em particular, os homens fizessem apenas o que deveriam com seu próximo, isso representaria uma grande ajuda para o sucesso dos empenhos coletivos do ministério e poderia haver esperança de que alguém se unisse todos os dias às fileiras da igreja? [...]

Isso traz muitas vantagens para nós. Isso aumentará a graça de vocês, tanto por ser um curso que Deus abençoará, quanto por ser uma ação deles para persuadir outras pessoas. Ele, que não permitirá que você desperdice um copo de água que foi dado por ele, não permitirá que você perca essas grandes obras de caridade; ademais, aqueles que praticaram essa obra de forma conscienciosa sabem, por experiência, que não há uma forma mais veloz e próspera de caminhar em direção ao céu do que quando ajudam outros a ir para lá. E em relação a nossos tesouros terrestres, o quanto mais você dá menos você tem; mas, aqui, quanto mais você dá mais você tem. Apresentar Cristo em sua plenitude aos outros aquecerá seu coração e impulsionará seu amor. [...] Isso aumentará sua glória e sua graça, [...] pois "aqueles que conduzem muitos à justiça serão como as estrelas, para todo o sempre" (Dn 12.3). [...] Isso o levará a ter muita paz na consciência, quer sejamos bem-sucedidos quer não; pensar que fomos fiéis e demos o melhor de nós para salválos, e que estamos limpos do sangue de todos os homens. [...] Ademais, essa é uma obra que, se formos bem-sucedidos, faz um coração honesto muito se regozijar. [...] Naturalmente, a toda obra responsável segue-se o regozijo, em grau compatível com sua bondade: aquele que faz mais o bem para os outros tem, geralmente, uma vida mais confortável e alegre. [...] Portanto, digo-lhes, a fim de persuadi-los com minha própria experiência, que se vocês soubessem que alegria é ser instrumento para a conversão e a salvação de almas, vocês iniciariam essa obra imediatamente e a perseguiriam dia e noite apesar dos maiores desalentos e resistência. Poderia também lhes falar sobre a nobreza e a honradez dessa obra, mas não farei isso, pois temo estimular o orgulho de vocês, em vez de seu zelo.